QUANDO A PESSOA JURÍDICA PODE UTILIZAR O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR NOS CONTRATOS DE ADESÃO?

Essa é uma dúvida frequente das empresas. Em muitos dos casos, as empresas são obrigadas a assinar um contrato que, na sua formação, não admite a discussão de cláusulas, tendo a sua participação reduzida à qualidade de mera anuente. Em resumo, ou se assina ou não se contrata.

Isso acontece, por exemplo, com a contratação de serviço de aluguel de bens móveis, de produtos de internet, de serviços de telefonia e de seguros.

A depender do uso dos bens contratados, os contratos por adesão podem ser tutelados pelo Código Civil ou pelo Código de Defesa do Consumidor. A relação consumerista se caracteriza diante de um contrato de adesão em que o bem contratado se esgota na própria atividade de quem os adquire, ou seja, são consumidos, não sendo transformados, modificados ou incluídos como parte do produto final de sua atividade, na forma como estabelecido no Código de Defesa do Consumidor, segundo o qual “Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”.

Ou seja, é necessário que o consumidor seja, de fato, destinatário final; que não utilize o produto ou serviço em sua cadeia produtiva (tese finalista). Por isso que, em muitos dos casos, as empresas não são agraciadas pelas leis protetivas do Código de Defesa do Consumidor.

Assim, mesmo com a limitação da autonomia da vontade de uma das partes em uma negociação empresarial (contratos empresariais), a aquisição de um bem ou serviço que será inserido na cadeia de produção do adquirente afastará a relação de consumo, recebendo, assim, portanto, a tutela do Código Civil para resolução de conflitos oriundos da contratação. Ainda assim, em situações de descumprimento das obrigações do contrato poderá ser evocada a regra do artigo 475, segundo a qual “A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos”.

Casos há, porém, em que, mesmo havendo contratação entre duas pessoas jurídicas, o Poder Judiciário tem aplicado o Código de Defesa do Consumidor. O STJ tem mitigado a aplicação da tese finalista em determinados casos, admitindo a aplicação do CDC para situações em que se evidencie a vulnerabilidade do empresário na relação firmada por contrato de adesão. Inclusive, há vários julgados do STJ que informam essa tendência, como, por exemplo, o julgamento do REsp nº  1.599.535 – RS, de relatoria da Exma. Sra. Ministra Nancy Andrighi: “Nesse sentido, esta Corte tem mitigado os rigores da teoria finalista para autorizar a incidência do CDC nas hipóteses em que a parte, embora não seja destinatária final do produto ou serviço, se apresenta em situação de vulnerabilidade”.

Em resumo, por regra não se aplica o CDC entre contratações empresariais, diante da aplicação da tese finalista (que exige a aquisição do produto ou serviço na qualidade de destinatário final). Por outro lado, o STJ tem constantemente mitigado a tese finalista para admitir a aplicação do CDC nas hipóteses em que há extrema vulnerabilidade de um dos contratantes, ainda que o contratante não seja destinatário final do produto ou serviço.

Em desfecho deste enredo, e, diante das possibilidades de narrativas que pode ter o cumprimento de um contrato, espera-se sempre que haja harmonia, bilateralidade e reciprocidade entre as obrigações pactuadas. É importante que o empresariado tenha a exata compreensão se, no caso, poderá ou não ser aplicado o Código de Defesa do Consumidor, em uma situação em que não se admite, por uma das partes, a discussão das cláusulas contratuais. Nesse sentido, a revisão da minuta do contrato de adesão é a ferramenta ideal para garantir a ciência e a defesa dos direitos. Pela análise, o advogado poderá apontar questões de aprovação puramente comercial ou técnica, além de realizar considerações a respeito de cláusulas abusivas, esclarecer o efeito legal de determinada cláusula, auxiliando o contratante a observar pontos que podem influenciar comercialmente na contratação, como por exemplo, multas excessivas, fomentando o empresário com informações relevantes na escolha de seus contratados.

Referências bibliográficas

BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8078.htm

BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial nº1.599.535 – RS, 3ª Turma, DF, 14 de março de 2017. Disponível em: https://processo.stj.jus.br/processo/pesquisa/?tipoPesquisa=-tipoPesquisaNumeroRegistro&termo=201601246153&totalRegistrosPorPagina=40&aplicacao=processos.ea

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